terça-feira, 3 de maio de 2011

Como se pode chamar sacana a uma pessoa com elegância!

Penso logo insisto                                                             José Niza

                                      O SÓSIA DO DR. NOBRE
     Ninguém está livre de ter um sósia.
     A mim já me aconteceu com o actor Jacinto Ramos. E até tinha muita graça. Eu entrava numa loja de Lisboa para comprar uma camisa e lá vinha: “Como vai o senhor Jacinto Ramos?...gostei muito de o ver naquela peça do Nacional”. E ele, em contrapartida, também me contava as confusões em que às vezes se via metido. Do género: “Ó senhor deputado, lá na Assembleia, não poupe os gajos”. Ou, então: “Gostei muito daquela música que fez para o Carlos do Carmo”.
     É assim. Acontece aos melhores.
E aconteceu agora ao dr. Fernando Nobre, ilustre médico das sete partidas do Mundo.


      Aproveitando a ausência do cirurgião numa missão no Sri Lanka apareceu subitamente na praça pública um cromo que é uma cópia perfeita do dito cujo: a mesma cara, os mesmos óculos, o mesmo sorriso vaidoso, a mesma estatura, cabelo igual. E, até, a mesma voz. Não se sabe de onde surgiu este sósia do nobre cirurgião. Mas a verdade é que ele anda por aí, como o Santana, com falinhas mansas de encantador de serpentes.
     Que o tipo é espertalhaço, ninguém duvida. E, como o dr. Nobre continuava naquele país onde os putos correm atrás das galinhas para lhes tirarem os pedacitos de pão que levam no bico, o farsante aproveitou-se da ausência do modelo original e lançou-se na política, pensando assim com os seus botões: “Já que falhou a Presidência, ao menos que venha a Assembleia. Não é tão bom, pagam pior, não tem vista para o Tejo e, ainda por cima, em vez de comandar só meia dúzia de assessores dóceis e engravatados, tenho de aturar 230 deputados, incluindo a Heloísa Apolónia, o Pacheco Pereira e aquele do PS que roubou um gravador aos jornalistas”.
     E, se bem o pensou, melhor o fez. Mandou um mail ao Passos Coelho: “Tenho aqui seiscentos mil votos, seiscentos mil votinhos, quanto é que isto vale, ó Pedro?”
     E o Passos – que andava ocupadíssimo a fazer desmentidos – passou a bola ao Relvas: Ó Miguel, arranja lá um lugar ao gajo”. E o dito Relvas – que em vinte anos de Assembleia nunca lá falou - foi então falar com o pseudo-Nobre julgando que eram favas contadas e ofereceu-lhe um lugar de deputado pela emigração.
     És parvo, ou quê? Tu sabes o que são seiscentos mil votos? Sabes? Pois o que eu quero é o lugar do Gama, o gabinete do Gama, o motorista do Gama, o Mercedes do Gama, as secretárias do Gama. Só não quero é as camisas às riscas e as gravatas do Gama”.
     E o Relvas: “Negócio feito, pá! Porreiro, pá! Assina aí, pá!”
 
     Foi então que, inesperadamente, o doutor Nobre, o autêntico, o verdadeiro, regressou do Sri Lanka. E ao chegar a Lisboa, o que é que viu? A sua fotografia nos jornais e a dizerem que era candidato do PSD, e que ia para Presidente da Assembleia, e coisas assim.
     Ficou fulo, possesso, mais furioso ainda que aquela galinha da Etiópia quando os putos lhe tiraram o pedacito de pão que levava no bico.
     Como era possível?
     Como é que era possível que o f. da p. do sósia andasse por aí a fazer negociatas com o PSD, ele que até odiava os partidos, e o poder, e a sacanagem da classe política?
    Como é que era possível que o troca-tintas do rasca do sósia quisesse ser deputado, se nem sequer conhecia o programa do PSD?
     Como era possível que o alarve do sósia quisesse passar por cima de gente decente como Manuela Ferreira Leite ou Mota Amaral?
     Como era possível que um aldrabão, um vira-casacas, um troca-tintas, um safardana sem princípios, um burlão político, lhe quisesse roubar seiscentos mil votos para os ir vender ao Passos e ao Relvas? Era demais!
     E então – como nos filmes – sabendo que o falso Nobre ia dar uma entrevista à televisão, fez-lhe uma espera. E, à saída. com um bisturi, limpou o sebo ao sacana.
     Que é para isso que servem os bisturis. E os sacanas.
     E assim, a calma voltou a Portugal.

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