PORTUGAL: QUE FUTURO?**
>
> *Cinquenta e cinco anos de vida.*
> *Filho de gente humilde. Filho da aldeia. Filho do trabalho. Desde criança
> fui pastor, matei cordeiros, porcos e vacas, montei móveis, entreguei
> roupas, fui vendedor ambulante, servi à mesa e ao balcão. Limpei chãos,
> comi com as mãos, bebi do chão e nunca tive vergonha. Na aldeia é assim,
> somos o que somos porque somos assim.*
>
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> *Cresci numa aldeia que pouco mais tinha que gente, trabalho e gente
> trabalhadora. Cresci rodeado de aldeias sem saneamento básico, sem água,
> sem luz, sem estradas e com uma oferta de trabalho árduo e feroz.*
> *Cresci numa aldeia com valores, com gente que se olha nos olhos, com gente
> solidária, com amigos de todos os níveis, com família ali ao lado.
> Cresci com amigos que estudaram e com outros que trabalharam. Os que
> estudaram, muitos à custa de apoios do Governo, agora estão desempregados e
> a queixarem-se de tudo. Os que sempre trabalharam lá continuam a sua
> caminhada, a produzir para o país e a pouco se fazerem ouvir, apesar de
> terem contribuído para o apoio dos que estudaram e a nada receberem por
> produzir.*
>
>
> *Cresci a ouvir dizer que éramos um País em Vias de Desenvolvimento e... de
> repente éramos já um País Desenvolvido, que depois de entrarmos para a
> União Europeia o dinheiro tinha chegado a "rodos" e que passamos de
> pobretanas a ricos "fartazanas".*
> *Cresci assim, sem nada e com tudo.*
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> **E agora, o que temos nós?**
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> *1. *Um país com duas imagens*.*
> *A de Lisboa: cidade grandiosa, moderna, com tudo e mais alguma coisa, o
> lugar onde tudo se decide e onde tudo se divide, cidade com passado,
> presente e futuro.*
> *E a do interior do país, território desertificado, envelhecido,
> abandonado, improdutivo, esquecido, pisado.*
>
> *2. *Um país de vícios*.*
> *Esqueceram-se os valores, sobrepuseram-se os doutores. Não interessa a tua
> história, interessa o lugar que ocupas. Não interessa o que defendes,
> interessa o que prometes. Não interessa como chegaste lá, mas sim o que
> representas lá. Não interessa o quanto produziste, interessa o que
> conseguiste. Não interessa o meio para atingir o fim, interessa o que me
> podes dar a mim. Não interessa o meu empenho, interessa o que obtenho. Não
> interessa que critiquem os políticos, interessa é estar lá. Não interessa
> saber que as associações de estudantes das universidades são o primeiro
> passo para a corrupção activa e passiva que prolifera em todos os sectores
> políticos, interessa é que o meu filho esteja lá. Não interessa saber que
> as autarquias tenham gente a mais, interessa é que eu pertença aos quadros.
> Não interessa ter políticos que passem primeiro pelo mundo do trabalho,
> interessa é que o povo vá para o...*
>
> *3. *Um país sem justiça*.*
> *Pedófilos que são condenados e dão aulas passados uns dias. Pedófilos que
> por serem políticos são pegados em ombros e juízes que são enviados para as
> catacumbas do inferno.*
> *Assassinos que matam por trás e que são libertados passados sete anos por
> bom comportamento!*
> *Criminosos financeiros que escapam por motivos que nem ao diabo lembram.
> Políticos que passam a vida a enriquecer e que jamais têm problemas ou
> alguém questiona tais fortunas. Políticos que desgovernam um país e
> "emigram" para Paris. Bancos que assaltam um país e que o povo ainda ajuda
> a salvar.*
> *Um povo que vê tudo isto e entra no sistema, pedindo favores a toda a hora
> e alimentando a máquina que tanto critica e chora.*
>
> *4. *Um país sem educação*.*
> *Quem semeia ventos colhe tempestades.*
> *Numa época em que a sociedade global apresenta níveis de exigência
> altamente sofisticados, em Portugal a educação passou a ser um circo. Não
> se podem reprovar meninos mimados. Não se pode chumbar os malcriados. Os
> alunos podem bater e os professores nem a voz podem levantar. Entrar na
> universidade passou a ser obrigatório por causa das estatísticas. Os
> professores saem com os alunos e alunas e os alunos mandam nos professores.
> Ser doutor, afinal, é coisa banal.*
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> *5. *Um país que abandonou a produção endógena*.*
> *Um país rico em solo, em clima e em tradições agrícolas que abandonou a
> sua história.*
> *Agora o que conta é ter serviços sofisticados, como se o afamado portátil
> fosse a salvação do país. Um país que julga que uma mega fábrica de
> automóveis dura para sempre. Um país que pensa que turismo no Algarve é que
> dá dinheiro para todos. Um país que abandonou a pecuária, a pesca e a
> agricultura. Que pisa quem ainda teima em produzir e destaca quem apenas
> usa gravata. Um país que proibiu a produção de Queijo da Serra artesanal na
> década de 90 e que agora dá prémios ao melhor queijo regional. Um país que
> diz ser o do Pastel de Belém, mas que esquece que tem cabrito de
> excelência, carne mirandesa maravilhosa, Vinho do Porto fabuloso, Ginginha
> deliciosa, Pastel de Tentugal tentador, Bolo Rei português, Vinho da
> Madeira, Vinho Verde, lacticínios dos Açores e Azeite de Portugal para
> vender. E tanto, tanto mais... que sai da terra e da nossa história.*
>
> *6. *Um país sem gente e a perder a alma lusa*.*
> *Um país que investiu forte na formação de um povo, em engenharias
> florestais, zoo técnicas, ambientais, mecânicas, civis, em arquitectos, em
> advogados, em médicos, em gestores, economistas e marketeers, em cursos
> profissionais, em novas tecnologias e em tudo o mais, e que agora fecha as
> portas e diz para os jovens emigrarem.*
>
>
> *Um país que está desertificado e sem gente jovem, mas com tanta gente
> velha e sábia que não tem a quem passar tamanha sabedoria. Um país com
> jovens empreendedores que desejam ficar mas são obrigados a partir. Um país
> com tanto para dar, mas com o barco da partida a abarrotar. Um país sem
> alma, sem motivação e sem alegria. Um país gerido por porcaria.*
>
> **E agora, vale a pena acreditar?**
> *Vale. Se formos capazes de participar, congregar novos ideais sociais e de
> mudar.*
>
> **Porquê acreditar?**
> *Porque oitocentos anos de história, construída a pulso, não se destroem em
> 40 anos. Porque o solo continua fértil, o mar continua nosso, o sol
> continua a brilhar e a nossa alma, ai a nossa alma, essa continua pura e
> lusitana e cada vez mais fácil de amar.*